36 TENTAÇÃO E PECADO

PEROLAS DA BIBLIA EXPLICADAS


Tentação. O sentido bíblico de tentação distancia-se do moderno de sedução, desde que significa pôr a pessoa em prova com o elevado objetivo de evidenciar ou melhorar a sua qualidade. 


Deus testa o seu povo, colocando-o em situações que revelam a qualidade de sua fé, para verificar o que está em seu coração, como vemos em Gênesis 22:1 e Êxodo 16:4; 20:20. 


Deus nos testa para nos purificar, assim como o metal é purificado no cadinho do depurador, fortalecendo-nos a paciência e amadurecendo nosso caráter (Sal. 66:10; Zac. 13:9; I Ped, 1:6), Por meio da fidelidade em tempos de provação os homens se tornam "doki moi" (aprovados) aos olhos de Deus (Tiago 1:12; I Cor. 11:19). 

As tentações são permitidas por Deus (Mat. 4:1; 6:16), mas Ele não consente que sejamos tentados acima do que podemos resistir (I Cor. 10:13). Deus dá ao seu povo a capacitação para resistir à tentação e também para se livrar dela (II Ped. 2:9). 


A tentação é permitida como um teste (Jó 1:9-12; I Ped. 1:17; Tiago 1:2 e 3), porém, de acordo com a teologia bíblica podemos ter uma certeza, este teste sempre visa o nosso bem, nunca é um incitamento para o mal. O desejo que nos impele ao pecado é nosso. De maneira nenhuma poderá ser proveniente de Deus. 

Tentação não ê pecado, pois Cristo foi tentado como nós o somos, mas permaneceu impecável (Heb. 4:15; Luc. 22:28). A tentação somente se torna pecado quando a sugestão para que se pratique o mal é aceita. 

O substantivo grego para tentação πειρασμοϖv (peirasmós) indica qualquer tipo de provação ou tribulação, incluindo a instigação para o pecado. Esta palavra é em pregada 21 vezes, tanto no sentido positivo quanto no negativo. 

Para o comentarista Russell Norman Champlin, as provações nos trazem os seguintes benefícios: 

1º) Promovem a glória de Deus. S. João 11:3-4; 21:8-19. 

2º) Mostram o poder e a fidelidade de Deus. Sal. 34:18-19; II Cor. 4:7-11. 

3º) Ensinam-nos a vontade de Deus. Deut. 4:30-31; Os. 2:6-7. 

4º) Fazem-nos voltar a Deus para obter ajuda. Deut. 4:30-31. 

5º) Fazem-nos buscar a Deus em oração. Juízes 4:3; Jer. 31:18. 

6º) Elas nos convencem do pecado. Jó 36:8 e 9; Sal. 119:67. 

7º) Elas nos ensinam a obediência. Gên. 22:1-2." 1


O Espírito de Profecia diz sobre tentação: 

"A tentação não é pecado, nem é indício do desagrado de Deus para conosco. O Senhor permite que sejamos tentados, mas mede cada tentação, distribuindo-a segundo as nossas forças para resistir e vencer o mal. É em tempos de prova e tentação que somos capazes de avaliar o grau de nossa fé e confiança em Deus, de calcular a estabilidade de nosso caráter cristão. Se somos facilmente impelidos e derrotados, devemos alarmar-nos, pois pouca é nossa resistência." 2 

"As provas sobrevirão a toda alma que ama a Deus. O Senhor não opera um milagre para impedir a provação, para escudar Seu povo das tentações do inimigo." 3 

Segue-se a resposta dada por W. Arndt, no livro A Bíblia se Contradiz?, págs. 63 e 64 à seguinte pergunta: "Deus nos Tenta?" 

"Gênesis 22:1: 'Depois dessas coisas, pôs Deus Abraão à prova...' 

"Tiago 1:13: 'Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal, e ele mesmo a ninguém tenta.'. 

"Como haveremos de explicar o fato de a Bíblia afirmar que Deus jamais tenta o homem quando em outros textos afirma que o tenta? A solução está no sentido da palavra 'tentar'. Esse temo é usado em sentido bom e um sentido mau. Quando empregado em sentido bom, significa experimentar ou provar um homem de modo tal, que a disposição de seu coração e suas convicções mais íntimas se tornem manifestas, a fim de que todos possam receber prova indiscutível quanto a seu verdadeiro caráter. Usado em sentido mau, significa incitar o homem a que faça o mal, para destruí-lo. Todas as aflições que Deus nos envia podem ser chamadas provas ou tentações que objetivam o nosso bem e como tais, deveríamos considerá-las bem-vindas. O próprio Tiago, que, na passagem supracitada, afirma que Deus a ninguém tenta, admoesta seus leitores poucos versículos antes: 'Meus irmãos, tende por motivo de toda a alegria o passardes por vária provações, sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança.' (Tiago 1:2-3). 

"Foi uma tentação dessa espécie que Deus trouxe sobre Abraão, uma provação severa, na qual ficou provado que sua fé era genuína e vigorosa, e na qual ela sem dúvida foi grandemente fortalecida, sendo que no fim da provação foram reafirmadas as gloriosas promessas que Deus lhe dera. Mas o termo também é usado para designar experiências do tipo oposto, ataques velados que objetiva a lançar o homem na perdição eterna. Quando Tiago diz com referência a Deus: 'E ele mesmo a ninguém tenta', fala daquelas seduções perniciosas arquitetadas pelos poderes do mal e que tem por objetivo nossa final e infindável miséria. Semelhantes tentações, naturalmente, não vêm de Deus. 

"Nessa conexão pode ser interessante uma palavra adicional sobre a sexta petição do Pai Nosso: 'E não nos deixes cair em tentação'. Essa petição muitas vezes tem sido entendida como dizendo que Deus tenta seus filhos. Na verdade, não diz nada disso. Simplesmente expressa a suplica de que Deus nos guie de maneira tal, que nossos inimigos não possam executar seus ímpios desígnios contra nós, a saber, seduzir-nos ao pecado. Guia-nos de maneira tal (este é o sentido da oração), que Satanás não tenha oportunidade para colocar pedras de tropeço em nosso caminho. De sorte que essas palavras não militam contra as declarações de Tiago de que Deus a ninguém tenta." 


Pecado


O aparecimento do pecado é apresentado na Bíblia como sendo um mistério. II Tes. 2:7 o chama de mistério da iniquidade. A origem do mal e a existência do pecado têm dado motivo a profundas divagações para a filosofia e teologia. 

"O pecado é um intruso, por cuja presença nenhuma razão se pode dar. É misterioso, inexplicável; desculpá-lo corresponde a defendê-lo. Se para ele se pudesse encontrar desculpa, ou mostrar-se causa para a sua existência, deixaria de ser pecado."4 

"É impossível explicar a origem do pecado de maneira a dar a razão de sua existência."5 

Sabemos que o pecado teve sua origem com Lúcifer. Criado com livre arbítrio, ele escolheu deixar de ser Lúcifer (portador de luz) para tornar-se o diabo. Para o significado do vocábulo diabo existem duas explicações: 

1ª) Lançado através do espaço para a Terra. 

2ª) É assim chamado, porque lançou na mente dos anjos dúvidas sobre o caráter de Deus. Continua através dos séculos a fazer esta mesma obra na mente dos homens. 


Definições Para Pecado


Por ser difícil incluir numa definição tão abarcante tema, serão apresentadas várias definições para melhor compreensão do assunto. 

É a transgressão da lei de Deus. I João 3:4. 

Toda a iniquidade é pecado. I João 5:17. 

O que não é da fé é pecado. Rom. 14:23. 

Toda a imaginação do coração não regenerado é pecado. Gên. 6:5; 8:21. 

A insensatez é pecado. Prov. 24:9. 

A omissão em fazer o que é bom é pecado. Tiago 4:17. 

Pecado de omissão consiste em deixar de fazer o que a lei de Deus ordena. Pecado de comissão consiste em fazer o que a lei proíbe. 

Paulo designa o pecado com vários nomes do vocabulário bíblico: impureza, violação da lei, iniqüidade, desobediência, transgressão, erro. 

Pecado é separação entre o homem e Deus. Is. 59:2. Pecado é quebrar o nosso relacionamento com Deus. 

Pecado é amor próprio, é egoísmo. O pecado fez com que o homem deixasse de ser Cristocêntrico, alterocêntrico, para tornar-se egocêntrico. Pecado é um mau estado da alma e este mau estado é essencialmente o egoísmo. A conversão consiste na crucifixão do próprio eu. Gál. 2:20. 

"Pecado é a falta de conformidade com a Lei moral de Deus, quer por ato, disposição ou estado." Strong. 

"Pecado é fechamento egoístico do homem em si mesmo, é negar-se a amar os demais, é ruptura de amizade." (Gutierrez - Teólogo da Libertação). 

Pecado é uma ação má, contrária a uma ordem que determina o que deve ser. 

"Pecado é qualquer desvio do padrão de perfeição revelado em Jesus Cristo." Cliffor E. Barbour. 

"Pecado é o oposto de santidade; pecado é discrepância de uma lei absolutamente santa." R. L. Dabney. 

"Pecado consiste em colocar o homem a sua vontade, ou o seu eu acima do amor e dos deveres." W. N. Clarke. 

"Pecado é qualquer falta de conformidade com a lei de Deus ou qualquer transgressão da Lei Divina." Assembléia de Westminster. 

"Pecado, no sentido mais lato, é um estado mau da alma ou da personalidade." A. B. Langston. 

Para o profeta Oséias pecado é uma alienação de Deus, tanto coletiva como individualmente. 

"Pecado é uma nota dissonante na harmonia da obra criadora de Deus." Francisco Jacinto Pereira Filho. 

Pecado é a vontade livre e consciente de praticar o mal. 

Pecado é mais do que transgressão, é a rebelião contra uma pessoa. 

Se desejar ter um amplo. quadro, embora dantesco, do que seja pecado, basta ler as declarações de Paulo em Rom. 1:18-32. 


Termos Bíblicos Para Pecado


Há no original, tanto hebraico quanto grego, várias palavras que podem ser traduzidas por pecado. 


I . Velho Testamento: 


Vários aspectos da concepção do pecado são encontrados no Antigo Testamento. 

Hatah - significa falhar no aspecto moral e religioso, não alcançar o alvo. Desviar-se do caminho reto. Corresponde ao verbo grego αμαρτανω (hamartano) como nos mostra a Septuaginta. 

Awon - enfatiza o aspecto moral, estar torcido, encurvado. Revela o estado da alma do pecador pelo peso da culpa do pecado. Pecado é mais que um ato, desde que awon indica o estado de culpabilidade do transgressor da lei. 

Pesha - em sentido religioso é o termo mais usado para pecado, por significar uma revolta contra Deus; quebrar a fidelidade à Aliança; tornar-se infiel. É a violação dos preceitos divinos ou rebelião contra Deus. 

Jó 34:37 mostra seu real significado: "Pois ao seu pecado (hatah) acrescenta rebelião (pesha). 

Raiah - É a palavra do Velho Testamento mais traduzida por maldade. Indica todo o tipo de mal com as nuances de indignidade, demência, tirania, disparate, mau procedimento. 

Rashá - É um termo forense, indicando que a pessoa é culpada perante a lei. Designa a culpabilidade perante os homens e perante Deus. (Num.5:7; Lev. 5:19). 

"No Salmo 51:1 e 2 Davi emprega três destas palavras hebraicas para apresentar um quadro completo de sua vida cheia de pecado; cada uma delas apresentando uma faceta de sua perversidade. A primeira é "pesha", dando uma idéia de sua ma em rebelião, culpada de haver transgredido voluntariamente a lei de Deus. O segundo pregado é "awon" que em geral se traduz por iniqüidade. Etimologicamente significa depravação ou tortuosidade. As cordas do seu coração e caráter se haviam entrançado, desafinando-se com o diapasão divino. o 3º vocábulo é "hatah" cuja idéia fundamental é errar o alvo Toda a sua vida tomara uma direção errada, visto que o pecado o cegara por completo. Sua vida se desviara do elevado alvo que havia proposto em seu coração." 6


II. Novo Testamento: 


As palavras aqui encontradas apresentam mais ou menos o mesmo sentido dos vocábulos hebraicos. 

Anomia - É um ato contrário à lei. O termo grego anomia corresponderia ao nosso – ilegalidade. O primeiro verso que nos vem à mente é I João 3:4 – 

"Todo aquele que pratica o pecado, também transgride a lei : porque o pecado ê a transgressão da lei." 

Adikia - Em grego a palavra significa privação de justiça, transgressão da justiça. O Dicionário Grego de Arndt and Gingrich assim define αδικιϖα (adikia), "injustiça, transgressão, maldade, perversidade." 

I João 5:17 "Toda a injustiça (adikia) é pecado. 

Hamartia - Perder o alvo. Corresponde ao "Ratah" hebraico. É a palavra mais usada para pecado no Novo Testamento, aparecendo 173 vezes. Nas cartas paulinas ocorre 60 vezes. 

"Deve ser notado, que no Novo Testamento hamartia não descreve um definido ato de pecado, mas sim um estado, do qual provém o ato pecaminoso." 

"Esta palavra é usada no Novo Testamento para expressar o pecado em geral ou em particular uma ofensa que se comete contra Deus, destacando a culpabilidade que esta produz sobre a pessoa que a comete. Surgem três tipos de hamartia: 

O pecado como ato individual (Atos 2:38; 3:l9; I Tim. 5:22; Apoc. 1:5; 18:4; Heb. 1:3; 2:17; 5:1). 

Como expressão que descreve a natureza corrupta do homem e sua hostilidade contra Deus, a qual se apresenta em formas como: ter pecado (João 9:41; 15:22,24; 19:11; I João1:8), temos pecado (I João 3:5) e morrer no pecado (João 8:21,24; 9:34; 1 Cor. 15:17), conhecimento do pecado (Rom. 3:20), permanecer no pecado (Rom. 5:13,20; 6:1 ), corpo de pecado (Rom. 6:6), carne pecaminosa (Rom. 8:3). 

Como pecado em sentido geral que entrou no mundo por um homem (Rom. 5:12), que se torna visível pela existência da lei (Rom. 7:7-9), engana ao homem (Rom. 7:11; Heb. 3:13), assedia-o (Heb. 12:1), habita nele (Rom. 7:17,20), desperta-lhe as paixões pecaminosas (Rom. 7:5) e toda sorte de concupiscência (Rom. 7:8). Todos os homens estão debaixo do pecado (Rom. 3:9; Gál. 3:22) ao qual são vendidos como escravos (Rom. 6:16,20; 7:14; João 8:34; Gál. 2:.17) para servi-lo (Rom. 6:6) de acordo com a sua lei (Rom. 7:23) e para receber seu salário (Rom. 6:23), que é a morte (Rom. 5:21; 7:11; Tiago 1:15)." 8 

Asébeia - É o pecado que separa o homem de Deus. É usada apenas 6 vezes no Novo Testamento e pode ser traduzida por impiedade, perversidade, pecado. Quem comete este pecado afasta-se de Deus. 


Diferença Entre Pecado e Pecados


Alguns comentaristas querem fazer nítida distinção entre pecado no singular (hamartia - estado), e pecados no plural (paraptoma - passos em falso). 

Pensemos nas seguintes afirmações: 

"Pecado é caráter; pecados são conduta. Pecado é centro; pecados são circunferência. Pecado é raiz; pecados são frutos. Pecado é o produtor; pecados são o produto. Pecado é natureza; pecados são manifestações. Pecado é fonte; pecados são o fluxo. Pecado é o que somos; pecados são o que temos feito... Deus abomina o pecado com uma santa indignação."9 


Calvino assim se expressou sobre o pecado: 

"O pecado, nesta vida, produz os tormentos de uma consciência acusadora; na vida futura, os tormentos da morte. Agora podemos colher o fruto da justiça, a saber, a santidade; e a nossa esperança firme e que, no futuro, colheremos a vida eterna. Essas bênçãos, a menos que sejamos embotados além de toda a medida, deveriam gerar em nossa mente o ódio e o horror ao pecado, como também o amor e o desejo pela justiça." 


Referências: 


O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo, vol. VI, pág. 16. 

Signs of the Times, 18 de dezembro de 1893. 

Review and Herald, 14 de setembro de 1897. 

Grande Conflito, pág. 493. 

Idem, pág. 492. 

Estudos no Livro dos Salmos, págs. 98 e 99, Kyle M. Yates. 

William Barclay, New Testament Words, pág, 119. 

Mário Veloso. O Homem uma Pessoa Vivente, págs. 88 e 89. 

C. N. Keen - A Doutrina do Pecado, pág. 7.