7 PREGAÇÃO COMO RESSUSCITAR OS MORTOS

Conquistador de almas


Colegas de serviço na vinha do Senhor, permitam-me chamar-lhes a atenção para um milagre dos mais instrutivos realizada pelo profeta Eliseu, conforme vem registrado no capítulo quatro do segundo livro de Reis. 


A hospitalidade da sunamita fora recompensada com a dádiva de um filho. Porém, ai! todas as bênçãos terrenas são de possessão incerta; depois de alguns dias o menino caiu enfermo e morreu.


A mãe angustiada, mas crente, apressou-se a recorrer ao homem de Deus. Por meio dele, Deus lhe fizera a promessa que atendera aos anelos da seu coração, e assim resolveu pleitear sua causa com ele para que a depusesse diante do divino Mestre e obtivesse para ela uma resposta de paz. A ação de Eliseu está registrada nos seguintes versículos:


"Disse o profeta a Geazi: Cinge os lombos, toma o meu bordão contigo e vai. Se encontrares alguém, não o saúdes, e, se alguém te saudar, não lhe respondas; põe o meu bordão sobre o rosto do menino. Porém disse a mãe do menino: Tão certo como vive o SENHOR e vive a tua alma, não te deixarei. Então, ele se levantou e a seguiu. 


Geazi passou adiante deles e pôs o bordão sobre o rosto do menino; porém não houve nele voz nem sinal de vida; então, voltou a encontrar-se com Eliseu, e lhe deu aviso, e disse: O menino não despertou. Tendo o profeta chegado à casa, eis que o menino estava morto sobre a cama. 


Então, entrou, fechou a porta sobre eles ambos e orou ao SENHOR. Subiu à cama, deitou-se sobre o menino e, pondo a sua boca sobre a boca dele, os seus olhos sobre os olhos dele e as suas mãos sobre as mãos dele, se estendeu sobre ele; e a carne do menino aqueceu. 


Então, se levantou, e andou no quarto uma vez de lá para cá, e tornou a subir, e se estendeu sobre o menino; este espirrou sete vezes e abriu os olhos. Então, chamou a Geazi e disse: Chama a sunamita. Ele a chamou, e, apresentando-se ela ao profeta, este lhe disse: Toma o teu filho. Ela entrou, lançou-se aos pés dele e prostrou-se em terra; tomou o seu filho e saiu." (2 Reis 4:29-37).

A posição de Eliseu neste caso é exatamente a sua, irmãos, quanto ao seu trabalho por Cristo. Eliseu teve que lidar com um menino morto. E certo que no casa em foca tratava-se de morte natural. Mas a morte com a qual vocês terão que relacionar-se não é menos verdadeira por ser espiritual. Os rapazes e moças das suas classe, bem como os adultos, estão 'mortos em ofensas e pecados'. Queira Deus que nenhum de vocês deixe de compreender inteiramente o estado natural dos seres humanos! Se não tiverem claro senso da completa ruína e da morte espiritual dos seus meninos, não poderão ser uma bênção para eles. Aproximem-se deles não como se estivessem apenas dormindo, e como se por sua própria capacidade os pudessem despertar; mas, sim, como de cadáveres espirituais que só podem ser vivificados pelo poder divino. 

O grande objetivo de Eliseu não era purificar o corpo do defunto, ou embalsamá-lo com especiarias, ou envolvê-lo em linho fino, ou colocá-lo em postura própria, e depois deixá-lo, cadáver ainda. Visava a nada menos que a devolução da vida ao menino. Caros mestres! Oxalá jamais se satisfaçam com propósitos que se restrinjam a oferecer apenas benefícios secundários, nem mesmo com a sua concretização. Lutem pela maior finalidade de todas: a salvação das almas imortais! Sua ocupação não consiste simplesmente em ensinar em suas classes as crianças a lerem a Bíblia, nem tampouco em inculcar-lhes os deveres morais, nem ainda em instruí-las na simples letra do Evangelho. Sua sublime vocação é a de serem os meios, nos mãos de Deus, para trazer do céu a vida espiritual às almas mortas. 

O ensino que ministram no dá do Senhor será um fracasso se os seus meninos continuarem mortos no pecado. No caso do professor secular, o bom aproveitamento demonstrado pela criança quanto aos conhecimentos prova que o professor não se esforçou em vão. Mas quanto a vocês, ainda que aqueles que estão a seu cargo venham a ser respeitáveis membros da sociedade, ainda que se tornem participantes assíduos dos meios da graça, vocês não acharão que as suas súplicas ao céu foram atendidas, nem que se cumpriram os seus desejos, nem que atingiram os seus altos objetivos, a não ser que algo mais tenha sido feito – isto é, a não ser que se possa dizer dos seus jovens : "O Senhor os vivificou juntamente com Cristo". 

Portanto, o nosso objetivo é a ressurreição! Ressuscitar os mortos é a nossa missão! Somos como Pedro em Jope ou como Paulo em Troas; temos ali uma Dorcas, aqui um Êutico para trazer à vida. Como é possível realizar obra tão singular? Se nos rendermos à incredulidade, iremos sentir-nos confusos, pelo fato evidente de que a obra para a qual o Senhor nos chamou está completamente além da nossa capacidade pessoal. Não podemos ressuscitar os mortos. Se nos pedissem para fazer isso, cada um de nós poderia dizer, como o rei de Israel: "Sou eu Deus, para matar e para vivificar?" Contudo, o nosso poder não é menor do que o de Eliseu, pois ele não pode, com suas próprias forças, devolver a vida ao filho da sunamita. É certo que não somos capazes de fazer palpitar de vida espiritual os corações mortos dos nossas alunos, mas um Paulo e um Apolo seriam igualmente incapazes. Esta verdade terá que deixar-nos desanimados? Não servirá, antes, para levar-nos a desprezar o nosso suposto poder pessoal, e conduzir-nos ao verdadeiro poder de que podemos dispor? Espero que todos nós já estejamos cientes de que o homem que vive na região da fé, habita no reino dos milagres. A fé negocia maravilhas, e a sua mercadoria consiste de prodígios.

A fé a promessa vê, 

e só a contemplará; 

do impossível se ri, 

e brada: 'Assim será!' 

Eliseu não era um homem comum, agora que o Espírito de Deus estava sobre ele, chamando-o para a obra de Deus, e ajudando-o nessa obra. Você também, mestre ansioso, devotado, dedicado à oração, não tem por que continuar sendo um homem comum. De modo especial veio a ser o templo do Espírito Santo, Deus habita em seu ser e, pela fé, você iniciou a carreira de um operador de prodígios. Foi enviado ao mundo, não para fazer o que está ao alcance dos homens, mas para fazer aquelas coisas impossíveis que Deus executa por Seu Espírito, empregando como instrumentos os Seus filhos crentes. Você tem de operar milagres, de fazer maravilhas.

Portanto, ao recordar quem é que opera por intermédio da sua pobre instrumentalidade, não considere a restituição da vida a esses meninos mortos como coisa improvável ou difícil, pois para realizá-la em nome de Deus você foi chamado. "Pois quê? julga-se coisa incrível entre vós que Deus ressuscite os mortos?" Ao notar a maldosa frivolidade e a obstinação prematura das crianças, a incredulidade vai-lhe sussurrar: "Poderão viver estes ossos?" Mas a sua resposta deverá ser; "Senhor Jeová, tu o sabes". Confiando todos os casos às mãos onipotentes, seu dever será profetizar sobre os ossos secos e sobre o vento celeste, e dentro em pouco você também verá no vale da sua visão pessoal a memorável vitória da vida sobre a morte. Assumamos desde já a nossa verdadeira posição, e tratemos de compreendê-la bem. Temos diante de nós meninos mortos, e nossas almas suspiram por trazê-los de volta à vida. Confessemos que toda vivificação há de ser realizada unicamente pelo Senhor, e nossa humilde petição é que, se Ele nos vai usar com relação aos milagres da Sua graça, mostre-nos o que deseja que façamos.

Tudo teria corrido bem se Eliseu tivesse lembrado que fora outrora servo de Deus, e se tivesse estudado o exemplo do seu amo a fim de imitá-lo. Tivesse feito isso, não teria enviado Geazi com um bordão, mas teria feito logo o que por fim foi constrangido a fazer. No primeiro livro de Reis, capítulo dezessete, acham a história de Elias ressuscitando um menino, e se vê aí que Elias, o amo, tinha deixado exemplo completo ao seu servo. E foi só depois de Eliseu o seguir em todos os seus aspectos, que o poder miraculoso se manifestou. Eliseu teria sido sábio, volto a dizer, se desde o início tivesse imitado o exemplo do seu senhor, cujo manto estava usando. Com muito maior ênfase posso dizer-lhes, meus conservos, que será bom que nós, como mestres, imitemos a nosso Senhor – estudando os modos e métodos do nosso Senhor glorificado, e aprendendo aos Seus pés a arte de conquistar almas. Exatamente como Ele, cheio da mais profunda compaixão, entrou em íntimo contato com a nossa desventurada natureza humana, e condescendeu em rebaixar-se à nossa triste condição, assim devemos aproximar-nos das almas com as quais temos de lidar, compadecer-nos delas com a compaixão de Cristo, e chorar por elas, derramando as Suas lágrimas, se é que desejamos vê-las ressurretos do seu estado de pecado. Somente imitando o espírito e a maneira de ser e de agir do Senhor Jesus ficaremos sabiamente habituados para ganha almas para Ele.

Todavia, esquecendo isto, Eliseu quis traçar um curso por si próprio, que exibiria com maior evidência a sua dignidade profética. Entregou seu bordão a Geazi e mandou que o pusesse sobre a criança, pois achava que o poder divino era tão abundante em sua pessoa que funcionaria de qualquer maneira. Conseqüentemente, a sua presença e os seus esforços pessoais poderiam ser dispensados. O Senhor não pensava assim. Receio que muitas vezes a verdade que transmitimos do púlpito – e sem dúvida se pode dizer o mesmo do que dizemos em nossas classes – é algo alheio a nós, algo que está fora de nós. Como um bordão que levamos na mão, mas que não faz parte de nós. Tomamos a verdade doutrinaria ou prática, como Geazi fez com o bordão, e a colocamos sobre o rosto da criança, mas não nos angustiamos por sua alma. Experimentamos esta doutrina e aquela verdade, esta anedota e a outra ilustração, este modo de ensinar uma lição e aquela maneira de entregar uma mensagem – mas a partir do momento em que a verdade que apresentamos seja uma questão alheia a nós mesmos, sem ligação com a parte mais íntima do nosso ser, não terá numa alma morta maior efeito do que o bordão de Eliseu teve no cadáver da criança.

Lástima! Receio que muitas vezes preguei o evangelho neste lugar, seguro de que se tratava do Evangelho do meu Senhor, o verdadeiro bordão profético e, todavia, sem resultado por não ter pregado com a veemência, com o zelo, com o amor com que devia ter pregado! E não farão vocês a mesma confissão, de que algumas vezes ensinaram a verdade – sim, a verdade, vocês sabem que o era – a pura verdade que encontraram na Bíblia, por vezes tão enriquecedora para as suas próprias almas, sem que, todavia, se seguisse algum bom resultado dela? E isso porque, conquanto tenham pregado a verdade, não a experimentaram como tal em seus corações, nem foram compassivos para com o "menino" a quem a verdade era dirigida, mas agiram à moda de Geazi, colocando com mão indiferente o bordão profético sabre o rosto da criança? Não admira que tenham que dizer com Geazi; "Não despertou o menino", pois o verdadeiro poder capaz de despertar não achou meio apropriado no seu mortiço modo de ensinar.

Não temos a certeza de que Geazi estivesse convicto de que a criança estava realmente morta. Falou como se ela estivesse apenas dormindo, e precisando ser despertada. Deus não abençoará aqueles mestres que não captam no coração o estado verdadeiramente decaído das crianças às quais ensinam. Se vocês pensam que a criança não é realmente depravada, se vocês favorecem tolas noções sobre a inocência da infância e sobre a dignidade da natureza humana, não deverão ficar surpresos se permanecerem áridos e infrutíferos. Como pode Deus abençoá-los no sentido de realizar uma ressurreição quando, se fizesse isso por intermédio de vocês, seriam incapazes de perceber a gloriosa natureza desse ato? Se o rapaz tivesse acordado, isso não teria surpreendido a Geazi; pensaria que ele apenas se sobressaltara depois de um sono extraordinariamente pesado. Se Deus devesse abençoar, com vistas à conversão dos pecadores, o testemunho daqueles que não acreditam na depravação total do homem, eles simplesmente diriam: "O evangelho é grande força moralizadora, e exerce a mais benéfica influência", mas nunca bendiriam e engrandeceriam a graça regeneradora pela qual Aquele que está assentado no trono faz novas todas as coisas.

Observem detidamente o que fez Eliseu quando fracassou em seu primeiro esforço. Quando falhamos numa tentativa, nem por isso devemos abandonar a nossa obra. Irmão ou irmã, se você não tem tido sucesso até agora, não é preciso deduzir que não foi chamado para a obra, como tampouco Eliseu podia ter concluído que não seria possível trazer o menino de volta à vida. A lição para o seu insucesso não é: cesse a obra, mas, sim: mude o método. O que está fora de lugar não é a pessoa; o plano é que não é sábio. Se você não tem sido capaz de reanimar o que pretendia, lembre-se da canção escolar:

"Se falha a primeira vez, 

tente outra e repita". 

Entretanto, não repita, usando o mesmo método, a menos que esteja certo de que é o melhor. Se o seu primeiro método não obtém bom êxito, terá que aperfeicoá-lo. Examine-o até encontrar o ponto em que falhou, e então, mudando o seu modo de agir, ou o seu espírito, o Senhor pode prepará-lo para um grau de utilidade que ultrapassará todas as expectativas. Em vez de perder o ânimo quando viu que o menino não despertava. Eliseu cingiu seus lombos e se lançou com maior vigor ao trabalho que o esperava.

Irmãos, notem onde estava colocado o menino morto: "E, chegando Eliseu àquela casa, eis que o menino jazia morto sabre a sua cama". Esta era a cama que a hospitalidade da sunamita preparara para Eliseu, a famosa cama que, com a mesa, a cadeira e o candeeiro, jamais será esquecida na igreja de Deus. Aquela cama seria usada para uma finalidade em que a boa mulher nem podia pensar quando, por amor ao profeta de Deus, preparou-a para seu repouso. Gosto de imaginar o menino deitado nessa cama, porque ela simboliza o lugar onde hão de jazer os nossos meninos inconversos, se queremos vê-los salvos.

Se havemos de ser uma bênção para eles, devem jazer em nossos corações, devem ser nossa carga dia e noite. Devemos levar conosco os casos deles ao silêncio do nosso leito. Temos que pensar neles nas vigílias da noite, e quando não pudermos dormir por causa da nossa preocupação, é preciso que eles compartilhem nossas ansiedades nas horas tardias. Nossa cama deverá testemunhar nosso clamor: "Oxalá viva Ismael diante de til! Oxalá os queridos meninos e meninas da minha classe venham a ser filhos do Deus vivente!" Elias e Eliseu nos ensinam que não devemos colocar o menino longe de nós, fora de casa, ou numa caverna subterrâneo de fria negligência, senão que, se queremos devolver-lhe a vida, devemos colocá-lo na mais calorosa compaixão dos nossas corações.

Continuando a leitura, vemos: "Então entrou ele, e fechou a porta sobre eles ambos, e orou ao Senhor". Agora o profeta se lança de coração ao trabalho, e temos uma excelente oportunidade para aprender dele o segredo da obra de ressuscitar meninos dentre os mortos. Se voltarem à narrativa de Elias, verão que Eliseu adotou o método ortodoxo, o método do seu senhor Elias. Lerão ali: 

"E ele lhe disse; Dá-me o teu filho. E ele o tomou do seu regaço, e o levou para cima, ao quarto, onde ele mesmo habitava, e o deitou em sua cama. E clamou ao Senhor, e disse: Ó Senhor meu Deus, também até a esta viúva, com quem eu moro, afligiste, matando-lhe seu filho? Então se mediu sobre o menino três vezes, e clamou ao Senhor, e disse: Ó Senhor meu Deus, rogo-te que torne a alma deste menino a entrar nele. E o Senhor ouviu a voz de Elias; e a alma do menino tornou a entrar nele, e reviveu". 

O magnífico segredo se encontra, em grande medida, na súplica vigorosa: Eliseu "fechou a porta sobre eles ambos, e orou ao Senhor". Diz o velho provérbio: "Todo púlpito fiel tem sua base no céu", significando que o verdadeiro pregador tem muito contato com Deus. Se não rogamos a bênção de Deus, se o alicerce do púlpito não estiver firmado na oração particular, o nosso ministério em público não terá sucesso. Assim se dá com vocês. O poder de todo verdadeiro mestre deve provir do alto. Se não estiverem habituados a entrar em teu quarto, fechando a porta; se não rogarem junto ao trono da misericórdia pela criança que está aos seus cuidados, como poderão esperar que Deus os honre com a sua conversação? 

Creio que um método excelente é levar as crianças em pessoa, uma por uma, para o seu gabinete, e orar com elas. Vê-las-ão convertidas quando Deus os capacite a individualizar a situação delas, a agonizar por elas, e a levá-las uma a uma para, a portas cerradas, orar por elas e com elas. Influi muito mais a oração elevada a Deus em particular e só com um menino do que a oração pública pronunciada na sala de aulas. Naturalmente, a influência não é maior com relação a Deus, mas, sim, com relação á criança. Em oração muitas vezes vem a ser, ela própria, a resposta. Sim, porquanto Deus, enquanto vocês vão derramando a alma, pode fazer com que sua oração seja um martelo capaz de quebrantar o coração que simples preleções jamais conseguem tocar. Orem com as crianças separadamente, e isto será instrumento de grande bênção.

E se não for possível fazer isso, de qualquer modo é preciso haver oração – muita oração, oração constante, veemente, oração que não aceita resposta negativa, como a de Lutero, que ele chamava de bombardeio do céu. Isto equivale a colocar um canhão apontado para as portas do céu para abri-las a tiros, pois assim triunfam na oração os homens fervorosos. Não saem de diante do propiciatório enquanto não possam bradar com Lutero: "Vici". "Venci, conquistei a bênção pela qual me empenhei." "O reino dos céus é tomado por esforço, e os que se esforçam se apoderam dele." Elevemos a Deus orações assim, violentas, que constranjam a Deus e prevaleçam sobre os céus, e o Senhor não permitirá que busquemos Sua face em vão!

Depois de orar, Eliseu adotou os meios apropriados. A oração e os meios devem andar juntos. Meios sem oração – presunção! Oração sem meios – hipocrisia! Eis ali o menino, e diante dele o venerável homem de Deus! Observem o seu singular modo de agir. Inclina-se sobre o cadáver, e põe a boca sobre a do menino. A boca morta e fria da criança recebe o toque dos lábios cheios de calor e vida do profeta, e uma corrente vital de saudável e cálida respiração é enviada através das frígidas e pétreas vias bucais sem vida, percorrendo a garganta e os pulmões. Em seguida, o santo homem, com o amoroso ardor da esperança, coloca os olhos sobre os da criança, e as mãos sobre as dela. As mãos cálidas do ancião cobrem as gélidas mãos do defunto.

Depois se estende sobre o cadáver e o cobre inteiramente como querendo transmitir sua própria vida ao corpo inanimado, para morrer com ele ou fazê-lo reviver. Ouvi falar de um caçador de camurça que serviu de guia a um medroso viajante. Quando se aproximavam de uma parte perigosa da estrada, o guia se amarrou firmemente ao viajante, e disse: "Ou ambos, ou nenhum de nós". Isto é: "Ou viveremos os dois, ou nenhum de nós; somos um". Foi deste modo que o profeta firmou misteriosa união entre si e o rapaz, e decidiu que, ou ficaria enregelado com a morte do menino, ou o aqueceria com a sua vida. 

Que nos ensina isto? 

As lições são muitas e óbvias. Vemos aqui, como num quadro, que se quisermos dar vida espiritual a um menino, precisamos compreender o mais claramente passível a sua condição. Está morto, completamente morto. Deus os fará entender que a criança está morta em delitos e pecados como outrora vocês o estavam. Prouvera a Deus, caros mestres, fazê-los entrar em contato com essa morte numa penosa, esmagadora, humilde e compassiva empatia. Digo-lhes que, na conquista de almas devemos observar como o nosso mestre agia. Pois bem, como agia? Quando quis levantar-nos da morte, que Lhe foi necessário fazer? Teve de morrer. Não havia outro caminho. 

Assim se dá com vocês. Se é que pretendem ressuscitar o tal menino, terão que sentir em si mesmos o frio e o horror da morte que há nele. É preciso um homem em agonia para dar vida a homens agonizantes. Não creio que possam tirar um tição das chamas sem chegar a mão bastante perto para sentir o calor do fogo. Devem ter, quanto possível, um definido senso da terrível ira de Deus e dos terrores do juízo vindouro, caso contrário, o seu trabalho carecerá de energia, faltando-lhe assim um dos elementos indispensáveis para o bom êxito. É minha convicção que o pregador não poderá falar sobre tais assuntos enquanto não os sentir pesar sobre ele como uma carga pessoal imposta pelo Senhor. "Preguei em cadeias", dizia John Bunyan, "a homens em cadeias". Estejam certos de que, quando a morte que há nos seus meninos alarme, deprima e esmague vocês, é então que Deus está prestes a abençoá-los.

Portanto, compreendendo o estado do menino, e havendo posto a boca sobre a dele, e as mãos sobre as dele, deverão em seguida esforçar-se para adaptar-se quanto possível à sua natureza, aos seus hábitos e ao seu temperamento. Sua boca deve encontrar as palavras próprias do menino, de modo que saiba o que lhe querem dizer. Deverão ver as coisas com os olhos dele, e o seu coração deve ter os sentimentos que ele teria, para que sejam companheiros e amigos. Deverão estudar os pecados próprios da adolescência e compreender compassivamente as tentações juvenis. Devem, na medida do passível, penetrar as dores e as alegrias da infância, Não devem impacientar-se face às dificuldades deste trabalho, nem achá-lo humilhante, pois se acham que alguma coisa é privação ou condescendência, não há lugar para vocês na escola dominical. Se lhes for exigido algo difícil, terão que fazê-lo sem achá-lo excessivo. Deus não quererá ressuscitar nenhum menino por intermédio de vocês, se não se dispuserem a ser tudo para ele, para de algum modo poderem ganhar sua alma para Cristo. 

Está escrito que o profeta "se estendeu sobre" o menino. Poder-se-ia pensar que devia estar escrito que ele "se encolheu". Eliseu era adulto, e o outro era menino. Não se deveria dizer que "se encolheu"? Não; "estendeu-se". E notem bem, coisa difícil é um homem estender-se sobre uma criança. Não é o tolo que é capaz de falar a crianças. O tolo sim estará muito enganado se pensar que suas tolices podem interessar aos meninos e às meninas. Ensinar aos pequeninos exige nossos melhores talentos, nossos estudos mais diligentes, nossos pensamentos mais rigorosos, e nossas faculdades mais amadurecidas. Por estranho que pareça, vocês não conseguirão dar vida ao menino enquanto não se estenderem. O homem mais sábio precisará pôr em ação todos os seus talentos para ter sucesso como professor de jovens. 

Vemos, pois, em Eliseu a percepção da morte do menino e sua adaptação à tarefa que lhe cabia; mas, acima de tudo, vemos compassiva empatia. Enquanto o profeta sentia a frieza do cadáver, o seu calor pessoal ia penetrando no corpo morto. Isto, por si só, não ressuscitou o menino, mas Deus agiu por esse meio. O calor do corpo do ancião passou para o menino e foi o meio para dar-lhe vida. Todo professor deve ponderar estas palavras de Paulo: "Antes fomos brandos entre vós, como a ama que cria seus filhos. Assim nós, sendo-vos tão afeiçoados, de boa vontade quiséramos comunicar-vos, não somente o evangelho de Deus, mas ainda as nossas próprias almas; porquanto nos éreis muito queridos". O genuíno conquistador de almas sabe o que isto significa. De minha parte, quando o Senhor me ajuda a pregar, uma vez apresentado o tema todo, e depois de haver disparado a ponto de deixar a arma como brasa viva, muitas vezes muni a arma com o meu próprio ser e disparei o meu coração nos ouvintes; e esse disparo é que, pela graça de Deus, conseguiu a vitória. 

Deus abençoará por Seu Espírito Santo a nossa ardente afinidade com a Sua verdade, e fará que esta realize o que a verdade sozinha, pregada friamente, não poderia fazer. Aqui, pois, está o segredo. Caro mestre, você deve comunicar a sua própria alma ao jovem. Deve sentir como se a ruína do rapaz fosse a sua própria ruína. Deve sentir que, se o menino permanecer sob a ira de Deus, isto lhe causa tanto sofrimento como se você mesmo estivesse sob a ira divina. Deve confessar os pecados dele a Deus como se fossem seus, e pôr-se na presença de Deus como sacerdote a rogar por ele. A criança foi coberta pelo corpo de Eliseu, e você deve cobrir sua classe com sua compaixão, estendendo-se com agonia diante do Senhor, procurando o bem estar dos seus alunos. Observem neste milagre o processo usado para ressuscitar o morto; o Espírito Santo continua misterioso quanto às suas operações, mas a forma dos meios externos é-nos revelada claramente aqui. 

Apareceu logo o resultado da obra do profeta: "a carne do menino se aqueceu". Quão satisfeito deve ter-se sentido Eliseu. Mas não creio que seu prazer e satisfação o tenham levado a afrouxar os seus esforços. Diletos amigos, nunca se dêem por satisfeitos ao ver os seus meninos numa condição ligeiramente esperançosa. Uma jovem se aproximou de você e lhe pediu: 'Ore por mim, professor"? Alegre-se, pois é um belo sinal. Busque mais que isso, porém. Notou lágrimas nos olhos de um rapaz quando lhe falava do amor de Cristo? Dê graças por isso, porque o corpo está ganhando calor, mas não pare aí. Irá afrouxar agora o seu empenho? Lembre-se de que não atingiu a meta ainda. O que você quer é vida, não apenas calor. O que você quer, caro mestre, do seu querido aluno, não é apenas convicção, mas conversão. O seu desejo não é só de impressão, mas de regeneração – ou seja, vida, vida de Deus, a vida de Jesus. É disto que necessitam os seus alunos, e você não deve satisfazer-se com menos. 

De novo lhes rogo que observem Eliseu. Houve uma pequena pausa. "Depois voltou, e passeou naquela casa duma parte para a outra." Observem a inquietação do homem de Deus; não pode ficar sossegado. O menino se aquece (bendito seja Deus por isso), mas não está vivo ainda. Assim, em lugar de sentar-se em sua cadeira, à mesa, o profeta anda de um lado a outro com andar impaciente, intranqüilo, gemendo, suspirando, ansioso e inquieto. Não poderia suportar o olhar da desconsolada mãe, ou ouvi-la perguntar: "Está restabelecido o menino?" Continuou, pois, a andar pela casa como se seu corpo não pudesse repousar por não estar satisfeita sua alma.

Imitem esta sagrada inquietação. Quando virem que um rapaz está um tanto impressionado, não vão sentar-se e dizer: "O menino dá muita esperança, graças a Deus; estou plenamente satisfeito". Jamais ganharão a pérola de grande preço desse jeito. Se hão de tornar-se pais espirituais na igreja, é preciso que fiquem tristes, inquietos, perturbados. A expressão de Paulo não é para ser explicada com palavras, mas vocês precisam conhecer o seu significado em seus corações: "de novo sofro as dores de parto, até ser Cristo formado em vós". Oxalá o Espírito lhes dê essas dores internas, esse desassossego, essa inquietação, e essa sagrada intranqüilidade, até que vejam convertidos os seus esperançosos alunos!

Depois de um breve período andando de cá para lá, o profeta "tornou a subir, e se estendeu sobre o menino". O que é bom uma vez, é bom outra vez. O que é bom duas vezes, é bom sete. Tem que haver perseverança e paciência. Domingo passado vocês foram muito zelosos; não sejam indolentes no domingo que vem. Como é fácil pôr abaixo num dia o que edificarmos no dia anterior! Se pelo trabalho de um domingo Deus me capacita a convencer uma criança de que eu estava agindo com seriedade, devo tomar cuidado para não a convencer, no domingo seguinte, de que não estou com aquele zelo sério. Se o meu calor passado aqueceu o menino, não permita Deus que a minha frieza futura torne a esfriar-lhe o coração. Assim como o calor de Eliseu passou para a criança, o frio de vocês passará para os seus alunos, se não estiverem com a alma cheia de ardor.

Eliseu estendeu-se de novo sobre o leito com muita oração, ansioso e cheio de fé, e por fim obteve o que queria: "o menino espirrou sete vezes, e abriu os olhos". Qualquer movimento seria sinal de vida e alegraria o profeta. Alguns dizem que o menino "espirrou" porque morrera de uma doença da cabeça, pois havia dito ao pai: "Ai, a minha cabeça! ai, a minha cabeça!", e os espirros serviram para limpar os condutos vitais que tinham ficado bloqueados. Não sabemos. O ar fresco, ao entrar de novo nos pulmões, bem poderia ter causado os espirros. O som não foi nem bem articulado nem musical, mas foi bom sinal de vida. Isso é tudo que deveríamos esperar dos jovens quando Deus lhes dá vida espiritual. Alguns membros da igreja esperam muitíssimo mais, porém eu, de minha parte, fico satisfeito se as crianças espirram – se dão algum sinal verdadeiro da graça, por fraco ou vago que seja. Se o caro menino reconhece o seu estado de perdição, e põe a sua confiança na obra perfeita de Jesus, ainda que notemos isso apenas por alguma expressão muito vaga, não como a que receberíamos de um doutor em teologia ou esperaríamos de uma pessoa adulta – não havemos de dar graças a Deus e receber o pequenino e cuidar dele para o Senhor?

Se Gemi estivesse ali, talvez não desse grande importância aos espirros, porque não se havia estendido sobre o menino nenhuma vez; mas isso contentou a Eliseu. Da mesma maneira, se vocês e eu temos de fato agonizado em oração pelas almas, teremos olhar bastante aguçado para captar o primeiro sinal da graça, e seremos agradecidos a Deus, mesmo que o indício não passe de um espirro. 

Em seguida o menino abriu os olhos, e nos aventuramos a dizer que Eliseu achou que jamais tinha visto olhos tão formosos. Não sei de que tipo eram esses olhos, se eram castanhos ou azuis, mas sei que quaisquer olhos que Deus lhe ajude a abrir serão belíssimos para vocês. 

Outro dia ouvi um professor falar de um "excelente rapaz" que fora salvo em sua classe, e outro fez referência a uma "querida jovem" de sua classe que amava ao Senhor. Não duvido. Seria de estranhar que não parecessem "excelente" e "querida" aos olhos daqueles que os levaram a Jesus, pois para Jesus Cristo os salvos são ainda mais excelentes e queridos. Diletos amigos, queira Deus que com freqüência fitem olhos abertos, olhos que, se a graça divina não se tivesse apropriado do ensino ministrado por vocês, teriam permanecido nas trevas, sob o véu da morte espiritual. Então vocês poderão considerar-se deveras favorecidos.

Uma palavra de advertência. Há nesta reunião algum Geazi? Se no meio deste grande grupo de professores da escola dominical há alguém que não pode fazer mais que levar o bordão, dá-me pena! Ah! meu amigo, que Deus, em Sua misericórdia, lhe dê vida pois, de que outra forma pode esperar ser o meio para ressuscitar a outros? Se Eliseu fosse também um cadáver, seria inútil esperar que a vida fosse comunicada colocando um morto sobre outro. Em vão esta ou aquela pequena classe de almas mortas se reunirá em torno de outra alma morta, como você. A mãe morta, queimada pela geada e enregelada, não pode dar alento ao seu filhinho. Que calor e que ânimo podem receber os que ficam a tiritar junto a uma lareira apagada? Assim é você. Oxalá opere a graça em sua alma primeiro, e depois o bendito e eterno Espírito de Deus que, só Ele, pode vivificar as almas, faça de você um instrumento para a vivificação de muitos, para a glória da Sua graça!

Caros amigos, aceitem minhas saudações fraternais, e creiam que minhas fervorosas orações estão com vocês, para que Deus os abençoe e os faça uma bênção.