18 OUTRAS CAVILAÇÕES - Os Gentios e a Lei

SUBTILEZAS DO ERRO


MOSTRANDO sua indisfarçada aversão pela lei divina, o oponente cita Rom. 2:14, isolando a expressão "os gentios que não têm lei", para concluir erroneamente que a lei só fora dada a Israel. Os gentios não precisam de lei. 

Ora, a Bíblia diz justamente o contrário, e preferimos crer nela. Em Isa. 56, por exemplo, lemos as grandes promessas feitas por Deus aos gentios que se unissem ao Seu concerto e guardassem a sábado. Note-se que o capítulo se refere à dispensação cristã, quando "a salvação está prestes a vir" e "a justiça a manifestar-se". Leia-se Núm. 15:10 e 16. Leia-se Gál. 3:29, que afirma que os cristãos são descendentes de Abraão e herdeiros conforme a promessa. 


A Escritura também não diz que Deus a é dos gentios? "É porventura Deus somente dos judeus? E não o é também dos gentios? Também dos gentios, certamente." Rom. 3:29. No entanto, este Deus, repetidamente é denominado "Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó". Todas as bênçãos divinas foram transferidas para a gentilismo: o concerto, a lei, o evangelho, tudo, enfim. Somos o Israel espiritual. 

Desmontemos o sofisma grosseiro que o autor teceu em torno de Rom. 2:14. Para melhor compreensão, leiamos do verso 11 a 16, e veremos que o apóstolo faz interessantes afirmações. 

1ª. Que Deus não faz distinção de homens (pois só tem padrão para julgá-los: a Sua santa lei. Sejam judeus ou gentios); 

2ª. Que os que pecaram, mesmo não conhecendo a lei, perecerão. Notem bem: perecerão (porque c salário do pecado é a morte). Não se diz que se salvam pela consciência da lei; 

3ª. Que os que pecaram, conhecendo a lei, por ela serão julgados. (Logo, não foi abolida porque será norma de julgamento.) Paulo diz isso em sentido genérico, não restrito aos judeus. E os que forem julgados por ela, sendo achados em falta, necessariamente serão condenados, pois a transgrediram; 

4ª. O verso 13 estabelece um cotejo entre os que "ouvem" e os que "praticam" as preceitos divinos. (Compare-se com S. Tia. 1:22-25.) E o apóstolo conclui que somente os últimos, os praticantes alcançam a justificação, e isto porque a sua fé os levou a obedecerem ao padrão do Céu. 

5ª. Os versos 14-16 em conjunto revelam que ninguém escapa ao julgamento de Deus, que julgará os segredos dos homens. Não escaparão mesmo os que não tendo lei, julgam praticar "as coisas que são da lei" sob o tríplice testemunho do coração, da consciência e do pensamento. 

Note-se que a alusão a "gentios" é motivada pelo contraste que Paulo estabelece da impenitência das judeus. A tese forçada de que a lei não é necessária aos gentios, encontra o seu desmentido especialmente nos versos 12 e 13. É só ler com atenção e entendimento. 

Milton C. Wilcox, em seu livro Questions Answered, pág. 96, faz judicioso comentário deste assunto, que reproduzimos: 

"A lei divina é uma só. O pagão que a tinha, ou supunha tê-la em sua capacidade, certamente julgava-se bem com a consciência mesmo nas tempos em que podia ter uma multidão de esposas. Àquele tempo ele podia praticar outras coisas que as próprias convenções da época não permitiriam – e que a luz da Palavra de Deus sem dúvida condenaria – tal como se deu com Abraão e Jacó. Mas sentiam-se bem com a consciência. A lei escrita em seus corações de início não constituía um conhecimento completo, senão um princípio de agir correto. Assim se expressa Deus em II Crôn. 16:9: "Os olhos do Senhor passam por toda a Terra para mostrar-Se forte com aqueles cujo coração é perfeito para com Ele." Isto é o que Deus requer – afeição perfeita, perfeito coração. 

A força impelente do homem é a sua afeição, seu amar, mesmo que seu conhecimento seja pouco. Pode mesmo ter vislumbrado apenas um raio de luz do trono de Deus; mas este raio de luz domina a sua vida, e o homem que se submete a ele é aceito por Deus. Mesmo tendo um conhecimento parcial da verdade, vive de acordo com a luz que possui. O pagão que tem pequena luz, sem dúvida submete-se a toda a luz, quando esta lhe for revelada, e alegremente submeter-se-á aos mandamentos divinos. Para ele é somente questão de revelação para confirmar o que já lhe está no coração. E este amor é abonado pelo Mestre para 'obediência da lei.' Porém aquele que tem o conhecimento da lei de Deus, expressa nos dez mandamentos, e ainda se submete ao pecado, por pequeno que seja, repele a luz. Se persistir nessa prática, será rejeitada por Deus. 

Concluir que os gentios não precisam de lei, seria admitir que eles não pecam, não precisam da revelação, não precisam de Deus. E se os gentios que não conheceram a lei, dispensam-na e se julgam pela consciência – como quer o autor – também, pelo mesmo raciocínio, os gentios que não conhecem o Evangelho podem dispensá-lo pelas mesmas razões. Por aí se vê a debilidade do argumento. 

Nada, absolutamente nada prova que a lei divina fora dada exclusivamente aos judeus, mas o que a Bíblia claramente revela é que Deus de modo especial honrou a Israel fazendo daquela nação Seu povo escolhido e depositário de Sua lei. Rom. 9:4. Era objetivo de Deus que Israel tornasse conhecida a Sua vontade expressa na lei, a todas as demais nações. Leiam-se ainda Deut. 4:6-8 e Rom. 3:1 e 2. E quando os gentios aceitaram a religião de Israel, também se sujeitaram à lei de Deus. Núm. 15:15 e 16. 

Deus proferiu Sua lei santa no monte Sinai. Ao seu redor estavam os judeus. Também ao redor de CRISTO, no sermão da Monte, só havia judeus ... Mas as bênçãos da lei e do Evangelho se estenderam aos gentios. Graças a Deus, pelo Seu dom inefável! 

Por onde se vê que a citação de Rom. 2:14 saiu às avessas para o autor, porque Paulo prova justamente o contrário, a validade da lei e sua extensão aos gentios. 

Diz o autor a certa altura que "pregar na lei ao povo remido é um insulto e uma ofensa à graça de Deus" (sic)! Calma, amigo. Então que grandes insultadores foram Cristo, Paulo, Tiago e João!!! E Wesley, Moody, Barnes, Clarke e outros. E o batista Taylor, que disse ser 'uma benção se cada púlpito trovejasse a voz divina do Decálogo, porque a lei é o aio que conduz a Cristo?" E milhões de cristãos obedientes ao divino padrão? 

O nosso zelo nas leva a afirmar: insultadores, na verdade, são os que desprezam a lei de Deus, pisam as seus preceitos, ou os que a negam deliberadamente!!! Examine-se cada um a si mesmo. 


Livre da Lei do Marido


À página 49 do libelo contra o Povo de Deus, o nosso opositor cita o começo, vejam bem, o começo do capítulo 7 da epístola aos Romanas (o símile da mulher casada, e a lei), para concluir desastradamente pela ab-rogação da lei divina. É realmente deplorável que tenha agido com tal subtileza. É lastimável que tenha chegado a uma conclusão inteiramente contrária a que o próprio Paulo chegou, conclusão que pode ser encontrada especialmente nos versículos 7, 12, 14 e 22: "porque eu não conhecia a concupiscência se a lei não dissesse: Não cobiçarás... E assim a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom... bem sabemos que a lei é espiritua1; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado... consinto que a lei é boa... Porque, segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus." (Grifos nossos.) 

Qualquer criança apreende o sentidos destes versículos! São claras demais!!! Forçoso é admitir que a conclusão paulina é inteiramente a favor da lei, e não contra. É de exaltação ao padrão divino, e não de desprezo. Paulo amava a lei de Deus. Fazia a apologia dela. Exaltava-a, como bom cristão que era. Mas o autor do livro foi infelicíssimo, pois está contraditando frontalmente o apóstolo. Está sendo mais realista do que o rei. É deveras lamentável que uma pessoa que se apregoa ministro do Evangelho chegue a tal despautério!!! 

Vamos estudar o tópico de Rom. 7, sem idéias preconcebidas. O que Paulo está explanando neste capítulo? O mesmo assunto dos capítulos precedentes e subseqüentes: o homem carnal – escravo do pecado – incapaz de salvar-se por si e que deverá encontrar a salvação pela graça de Deus em Cristo Jesus. 

Notemos que Paulo estabelece a premissa: '"a lei tem domínio sobre o homem por todo o tempo em que vive." Rom. 7:1. Na mesma epístola, em vários lugares, ele demonstra que o pecador, por ter transgredido a lei de Deus, está sob o domínio do pecado. Em outras palavras, nossa velha natureza pecaminosa – que Paulo define como "velho homem", exerce domínio sobre nós. Por isso declarou o apóstolo sobre o seu estado anterior: "o que quero, isso não faço, mas o que aborreço isso faço." V. 15. Quis ele dizer que nós, por nós mesmas, não podemos nos livrar do domínio do pecado. 

Como nos libertaremos, então, do "velho homem" que nos mantém em sujeição? Somente pela morte desse "velho homem" ou seja, pela nossa conversão, porque assim, pela conversão, a nossa velha natureza é crucificada. Leia-se Rom. 6:6. Mas, não é bastante a morte do "velho homem"; é necessário o nascimento do "novo homem." Rom. 6:4. 

No caso em tela, Paulo alude a esta mudança que se opera no homem, e para ilustrá-la convenientemente, usa o símile de um matrimônio. Nesta comparação, há 4 partes principais: uma mulher, seu primeiro marido, seu segundo marido, e a lei do matrimônio. Leiam-se atentamente os versos 2 e 3. 

A mulher representa aí o pecador, ligada ao primeiro matrimônio ou seja o "velho homem" com suas paixões e cobiças, ao qual está ligado pela lei; porém não pela lei em si, mas o seu objeto, o que ela estabelece e aponta: o pecado. E para desfazer qualquer idéia equívoca a esse respeito, Paulo apressa-se em advertir incisivamente: "É a lei pecado? De modo nenhum." V. 7. Enquanto o "velho homem" viver, está ligado à "mulher", que a ele se sujeita. Se morre o "marido," então o pecador se livra da condenação da lei, tornando-se um "novo homem", quer dizer, ligando-se a Cristo, o novo marido. 

Tão clara é a parábola paulina! 

O primeiro ponto importante, nesta ilustração, é que Paulo não está falando da morte da lei, mas da morte de um marido. É nem haveria objetivo na ilustração, se a lei fosse morta, pois se o fosse, nada haveria que prendesse a esposa a seu marido. E também qualquer referência a adultério seria inadmissível (verso 4). Como haveria a possibilidade de adultério – que é transgressão de um mandamento da lei de Deus – se a lei que o aponta fora morta? Meditem bem nisso os leitores. Vejam a barafunda em que o autor se meteu por querer torcer o sentido claro das Escrituras!!! 

A lei do matrimônio não fica abolida, por morte de um marido. A aplicação paulina é a vida do homem que se converte do pecado para a justiça. A primeira parte do verso 4 é claríssima. É só ler com entendimento. 

Fomos crucificados com Cristo. Seu corpo crucificado vicariamente por nós. Toda a exigência condenatória da lei sobre o nosso "velho homem" cessa com a morte de tal "homem." Assim estamos livres da condenação para estar casados com Cristo. Então "demos frutos para Deus". 

E ainda, deve-se considerar o seguinte: se o estar "livre da lei" (v. 6) se refere à morte da lei – como quer o oponente – então estaria Paulo fazendo horrível confusão no próprio símile do casamento, e contradizendo irremediavelmente as afirmações literais do mesmo contexto. Mas não é assim. Ele fala da morte de um marido, e pela aplicação, refere-se à nossa morte. O verso 4 não diz que a lei está morta, mas nós é que estamos mortos para a lei (pois ela não nos pode mais condenar, em virtude do nosso casamento com Cristo). 

A expressão "morremos para aquilo em que estávamos retidos", claramente refere-se à nossa natureza pecaminosa. O pecado, agindo mediante a nossa natureza corrupta, era o que nos retinha. (Vs. 24 e 25). E acrescente-se que o original diz "tendo morrido" ou "estando mortos", o que reforça e esclarece ainda mais o pensamento do apóstolo. 

Os eruditos Jamieson, Fausset  e Brown assim concluem: 

"A morte aí referida, como vimos, não é da lei, mas a nossa, e isso mediante a união com o Salvador crucificado." 

Assim entendem os sinceros estudiosos do Livro Santo. E assim se reduz a pó a dialética do adversário. 

À pág. 54, o autor engloba em "mandamentos" todas as ordens, mandados, admoestações e diretrizes dos apóstolos, confundindo-os com mandamentos da lei de Deus. Não há dúvida que houve "mandamento" de profetas, de Cristo, de Paulo, de Pedro e de outros. Muitos deles restritos ou para serem cumpridas por certos grupos, igrejas ou pessoas sob certas circunstâncias. Mas para o investigador sincero, é óbvio que tais "mandamentos" nada têm que ver com o decálogo, e nivelá-los com a eterna lei de Deus, denota incompreensão da revelação bíblica. Nada melhor que o contexto para esclarecer a que se referem os mandamentos. 

E com espírito despida de conceitos pré-firmados, com simplicidade e dentro da exata contextuação é que se pode ser guiado pelo Espírito na compreensão da Palavra de Deus.