16 ANÁLISES PROVEITOSAS

SUBTILEZAS DO ERRO


O QUE fica patente é que o autor de O Sabatismo à Luz da Palavra de Deus investe contra um sistema adventista concebido e engendrado por ele, amuletado nas deturpações de Canright, pretendendo que esse imaginoso e esdrúxulo background doutrinário se identifique com a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Aconselhá-lo-íamos a ler as "Crenças Fundamentais dos Adventistas do 7.º Dia." Conhecesse o autor, realmente, o que cremos e ensinamos, em sã consciência, não reeditaria o amontoado de absurdos que constitui o seu livro. 

A sua ignorância em relação ao nosso curriculum doutrinário vai ao ponto de afirmar e reiterar que, para os adventistas, excluindo-se os dez mandamentos, tudo o mais na Bíblia é lei cerimonial. 

Ora, isso é inverídico e exige reparo, a bem da verdade. Não sabemos onde buscou tal disparate. De fato, ensinamos que a lei moral se consubstancia no decálogo, como um código distinto, inconfundível, perfeito, escrito pelo dedo de Deus e, sendo de redação divina direta (não inspirada a homem algum), como tal deve ser crido e obedecido sem alterações. Os preceitos morais que se esparramam pelas Escrituras, são derivações do decálogo, seus enunciados aplicando-se às circunstâncias. Não há dúvida que o decálogo é distinto. 

Excluindo-se, portanto, a lei moral, resta analisarem-se as outras leis, preceitos, estatutos, mandamentos e testemunhas. É preciso atentar para o seu conteúdo, sua substância e sua finalidade, pois essa análise é de suma importância para o esclarecimento da matéria. 

Com um pouco de percepção, facilmente se discernem preceitos cerimoniais por sua natureza – os que dizem respeito ao culto, aos tipos, às festividades. A mesma percepção descobre estatutos civis, e também preceitos ou conselhos de origem sanitária. 


Como é óbvio, estas duas últimas classes de mandamentos não podem ser confundidas com os cerimoniais, porque não se relacionam com o Cristo vindouro. Não eram típicos ou prefigurativos. O conjunto de preceitos morais regulava relações entre cidadãos de uma comunidade, a comunidade judaica, circunstancialmente teocrática. Outro conjunto de preceitos traçava diretrizes sobre saúde, profilaxia e temperança. NÃO ERAM CERIMONIAIS. 

Como tudo que escrevemos tem mais sentido esclarecedor do que polêmico, é bom situarmos a maneira como entendemos as enunciações legais das Escrituras, aliás em consonância com os mais antigos e autorizados intérpretes e redatores de confissões de fé, e de acordo com a mais racional, lógica, boa e precisa dedução à vista da contextuação clara e exuberante que há sobre a matéria "lei." 


Breve Conceituação das Leis Bíblicas


Embora a Bíblia não tenha sistemática, contudo quem a lê com um coração dócil, com espírito analítico e sem idéias preconcebidas, poderá discernir, quanto à natureza, conteúdo e finalidade, quatro categorias de leis: 

a) a lei moral, cuja matriz, feita pelo dedo de Deus, é o decálogo. Como estabelece diretrizes que comandam relações entre o homem e Deus e entre o homem e o próximo, tais veículos jamais se desfarão enquanto Deus for Deus e o homem, homem. É uma lei eterna, que estamos obrigados a guardar, principalmente na dispensação evangélica, se quisermos ser cidadãos do Reino de Cristo, Pais por Ele somos habilitados a guardá-la. 

No "Catecismo da Doutrina Batista," pelo pastor W. D. T. MacDonald, págs. 28 e 29, lemos o seguinte: 

"41ª. P. – Sendo a salvação gratuita, temos a obrigação de cumprir a lei de Deus? 

"R. – Sim. Todos nós temos obrigação de cumprir a lei moral (O autor cita S. Mat. 5:19; I S. João 5:3; Rom. 6:1 e I Cor. 7:19). 

"42ª. P. – Que é lei moral? 

"R. – Lei moral é a que nos prescreve as obrigações para com Deus e o próximo, e se acha expressa nas seguintes palavras de Jesus Cristo: (O autor cita S. Mat. 22:37-40). 

"43ª. P. – De que maneira mais explícita se acha a lei exposta na Bíblia? 

"R. – A lei acha-se expressa com maior minuciosidade nos dez mandamentos, dados por Deus a Moisés no Monte Sinai." 

Agradecemos aos amigos batistas, por nos terem ajudado neste tópico, com tão clara definição de lei moral, e crerem que temos o dever de cumpri-la, mesmo sendo a salvação gratuita, como também cremos. Não sabemos como pode o autor harmonizar a sua crença anominiana com a crença oficial da igreja a que pertence. 


b) a lei cerimonial, que foi instituída após a Queda, depois que o homem foi destituído da glória original. Teve essa lei o escopo de ensinar ao povo de Israel – detentor dos oráculos divinos – o sacrifício de Cristo, na figura dos sacrifícios dos cordeiros que eram imolados. E este propósito devia ser cumprido na era pré-cristã, ensinando aos crentes o meio de que se deviam valer-se para obterem o perdão da lei moral e eterna transgredida (porque pecado é transgressão da lei), até que viesse o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. 

Essa lei que regulava o culto no santuário, os holocaustos e ofertas, as festividades e ritos vários – tudo simbólico e prefigurativo – naturalmente cessou na cruz. A ela ninguém mais está obrigado. No início do estabelecimento do cristianismo, elementos conservadores vindos do judaísmo (judaizantes) não queriam, de pronto, se desvencilhar destas práticas cerimoniais, ocasionando sérios estremecimentos nas igrejas nascentes, notadamente de Roma, Galácia e Colossos. Estes assuntos são tratados nas epístolas paulinas dirigidas àquelas igrejas. Em suma, a lei cerimonial – escrito de dívida contra nós – caducou, por ter preenchido a sua finalidade. 


c) Lei civil judaica, de que Israel como nação não podia prescindir. Regulava as relações dos cidadãos, definindo os seus direitos e deveres. Ela se esparrama pelo Pentateuco, aludindo à propriedade, casamentos ilícitos, divórcio, escravatura, herança, guerra, usura, fuga, empréstimos, crimes, imoralidades, e também cominava as penas. Ela era, em suma, os códigos civil, penal e processual dos israelitas. Moisés era também legislador e juiz. Sendo Israel nação teocrática, a padrão era a lei moral. A sua transgressão, além de ser pecado contra Deus, era crime punível pelas leis nacionais. 

Como é óbvio, desaparecendo a nação judaica, extinguiu-se, ipso facto, esta lei nacional, por carência de aplicabilidade. É claro que os cristãos, sujeitos às leis de seus países de origem (Rom. 13:1-7) nada têm que ver com os estatutos civis mosaicos. 


d) Preceitos higiênicos, que, a rigor, não constituem uma lei, mas tratavam de altos princípios sanitários, de saneamento, de prevenção ao contágio de moléstias repelentes e, sobretudo, de elevados padrões nutricionistas. A proibição de comer alimentos imundos (hoje homologada pela ciência) dizia respeito ao bem-estar físico, à saúde de um povo escolhido e separado por Deus. Esses preceitos, altamente salutares, que proporcionavam mens sana in corpore sano, devem ser observados por quem aspire a viver no ambiente puro do Reino de Cristo. Não é apenas a abstenção do álcool, do fumo, do jogo, ou de entorpecentes, que caracteriza a cristão. O seu corpo é o "templo do Espírito Santo" e este depósito sagrado não pode ser contaminado com alimentes inconvenientes, nocivos e alguns formalmente condenados pela Palavra de Deus. 

É inadmissível supor que Cristo tenha cravado na cruz leis higiênicas ou regras bíblicas de temperança tão benéficas ao homem. Disse credenciada escritora: "A santificação exposta nas Sagradas Escrituras tem que ver com o ser todo – as partes espiritual, física e moral. Eis a verdadeira idéia sobre a consagração perfeita. Paulo ora para que a igreja em Tessalônica possa desfrutar esta grande bênção: "E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e CORPO sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo." I Tess. 5:23." (EGW, Santificação, 7) 

É fora de dúvida, pois que estas espécies de leis estão bem definidas no Livro Santo, e afirmar o contrário é ir contra a evidência dos latos. Por isso causam risotas as absurdas citações que o autor faz à pág. 36, de estatutos marcantemente civis (Êxo. 22:21 e 22; 23:2; Lev. 19:2, 16 e 18; Deut. 16:19 e 18:13) confundindo-os com preceitos morais. É incrível! Faz, em outros lugares, uma mixórdia de leis de natureza diversa, num baralhamento intencional, porque somente fazendo-se essa trama, se poderá sustentar a esdrúxula tese de que a lei de Dons foi abolida. Mas essa confusão propositada, além de não revelar bom espírito, denota falta de percepção, uma babel irremediável. É de causar pena. 

O fato de a Bíblia não mencionar os adjetivos "moral," "cerimonial," "civil," "higiênico" etc., não destrói o fala de existirem leis assim averbadas. O que se busca na Bíblia são fatos e não termos. Negar um fato bíblico, só porque a Escritura não menciona a palavra pela qual esse fato é designado, é uma insensatez e uma grande insinceridade. Assim poderíamos proceder em relação a "ascensão," "encarnação," "Trindade," e outros fatos, cujos nomes a Bíblia não traz. 

Relevem os leitores por termos insistido na tese da conceituação das leis. Fizemo-lo por que gostamos de tudo em pratos limpos, e matéria de tal relevância precisa ser bem esclarecida, tanto mais que o autor se mostrou ignorante em relação ao que cremos. 

Iremos até ao fim, sem deixar uma acusação sequer de ser analisada e destruída.